**CAP 2. EU QUERO FICAR AQUI**

Olhos grudados na garota desmaiada a minha frente, meu coração disparado, minha cabeça a mil. Cali estava excitada com a confirmação da existência de Mabelai, exuberante a meu lado esquerdo, usando de uma magia por mim desconhecida para realizar sua parte do trabalho.
Enquanto isso, Igor apaga a memória de Jaqueline, a garota que trouxemos até ele para procurar por pistas de minha irmã Mabelai.
Minha... Irmã.
Ainda não consigo me acostumar com isso.
Há 3 meses atrás tudo o que eu tinha era um lago e um ser que me visitava ás vezes, e nenhuma noção de quem eu era. E agora, tenho uma origem, amigos, propósito... e também tenho o mundo humano, o qual amo de paixão.
Não, ainda não me lembro de nada, de como ou quem eu era, aonde estive, ou o que fiz. Não lembro de Guendri, nem de Mabelai, nem de ninguém. Aliás, se Cali não tivesse me dito meu nome, nem isso eu saberia. Minhas memórias nunca mais serão recuperadas. Mas creio que agora sei tudo o que preciso saber sobre quem sou.
Alexandrai. Fada de Adaris e Filha de Guendri.
Mas por favor, me chamem de Alexis. Caliandrei de Cali, Mabelai de Mabel.
Soa mais... normal.
E normal para mim é humano. E quanto mais humana eu soar, mais feliz eu fico.
Não me entendam mal, eu quero recuperar Adaris, apesar de nunca ter conhecido nada lá além de minha gruta. Entendo e respeito minhas supostas ligações com o lugar. E também quero encontrar minha suposta irmã.
Mas meu negócio é o planeta Terra.
Eu bem que poderia deixar tudo para trás e não dar a minima.
Já pensei em fazer isso. Se não fosse por Cali eu já teria dado o fora.
Mas, honestamente, não quero deixar Adaris nas mãos de Garou.
Confesso que, no primeiro momento em que Cali me encontrou, e me disse quem eu era, não acreditei.
E por que acreditaria?
Eu não era ninguém, eu não tinha nada. Garou era tudo para mim. Ele me tinha em suas mãos.
Mas algo dentro de mim decidiu dar uma chance ao que Cali me dizia. Algo dentro de mim entendeu que havia algo mais além daquele lugar onde Garou me escondia.
Eu precisava descobrir o que era.
Quando pisei no mundo humano, entendi que nunca mais poderia ser a mesma. Não poderia me esconder da vasta imensidão que é viver numa alcôva fria e sombria, comendo migalhas oferecidas por um falso deus que só nunca me disse a verdade.
Imfelizmente, não posso conhecer ou andar por Adaris. Não posso arriscar ser vista fora de meu esconderijo e pôr tudo em risco, alertando Garou que sei mais do que ele me faz acreditar.
Aliás, por esconder de mim a verdade, ele vai pagar caro.
Nosso plano está funcionando até agora. Garou não suspeita de nada, nem de que Cali e eu não estamos mais a mêrcer de seu controle, nossas mentes blindadas a seu poder.
Só que, esse tipo de mágica não pertence à fadas. A magia das fadas é baseada em ilusões. Dependendo do quão poderosa a fada é, ela pode te fazer acreditar em qualquer coisa.
Nossos poderes não funcionam no mundo humano, apenas em Adaris. A não ser que usemos um condutor, algo que humanos gostam de chamar de "varinha de condão". Cada fada tem a sua. E não, não são necessariamente varinhas. Cada fada transfere seu poder para o objeto que quiser e assim o utiliza.
Não faço idéia de onde está a minha. Um dia, talvez, a recuperarei. Cali mal usa seus poderes de fada, já que aprendeu outra magia mais efetiva.
-Realizou o deseja da menina, Cali? - Igor pergunta.
-Sim. -Cali responde. -Apagou agente da memória dela?
Igor confirma.
-Quem é a próxima garota da lista que ele te deu?
-Ainda temos que contactá-la.-Respondo. - Mas acho que seu nome é Venérea...
-Verena. -Cali me corrige, com um sorriso.
Eu me levanto. Depois da garota aceitar ter a mente lida em troca de um desejo realizado por Cali, uma parte do acordo é que nos apagamos de sua memória.
É melhor não deixar pra trás pistas do que estamos fazendo.
Minha parte é levá-la para casa com segurança, antes que ela acorde. E quando acordar, não se lembrará de nenhum de nós três.
Coloco a garota em meu ombro com facilidade. Uma das coisas que aprendi sobre mim é que sou forte. Bem forte. E que sei lutar. Uma das pessoas que nos ajuda me faz praticar. Ou como ele diz, re-aprender. Já que, de acordo com ele, as filhas de Guendri são formidáveis guerreiras.
Saio por trás do clube "O Lírio", estabelecimento de Igor, uma casa de shows de Drag Queen bem famosa, na Rua Augusta, capital de São Paulo. Amo esse lugar. É divertido. Foi aqui que aprendi a dançar. Aqui onde ouvi musica pela primeira vez. Aqui onde a vida humana começou a me interessar mais que a de fada.
Meia hora depois, encontro a casa de Jaqueline, entro pela janela e a deixo em sua cama.
Me despeço dela e a agradeço mesmo sem ela poder me ouvir. Imagino que tenha sido dificil para ela acreditar no que contamos, e ainda assim, ela aceitou nos ajudar. É claro que a pequena bebida que Cali oferecia antes ajudava qualquer um a acreditar em qualquer coisa. Mas, mesmo assim.
Eu mesmo ainda tenho minhas duvidas. Mesmo depois de hoje, confirmando que sim, Mabel existe.
Mas não quero elevar minhas esperanças apenas para tê-las destruidas.
O que fazer quando se descobre que tem uma irmã do nada?
Não sei qual a resposta mas, quero encontrá-la.
Volto para o apartamento de Igor. Cali já voltou para Adaris.
-Parece pensativa. E nervosa. - Igor coloca seu braço sobre meu ombro. Ele emana o mesmo calor e vibe que Garou.
-Confirmar que Mabel existe.. é tão...surreal. -Conto.
-Confirmar que você e ela existem me é surreal. -Diz Igor. -Se eu soubesse que as filhas de Guendri não eram só lendas, eu as procuraria desde quando Garou me expulsou de Adaris.
Parados em frente a sua casa de show, assistimos pessoas aproveitando as ultimas horas da noite de sábado, indo de uma balada, a outra.
Eu queria ser como elas. Sinto uma pontada de inveja da liberdade que elas tem.
-Bem que eu queria que ele me expulsasse também. -Sussurro, mais para mim que pra ninguém.
Posso ver o sorriso triste de Igor aob luz amarela da lâmpada de rua.
-Em breve, amiga. -Ele coloca meu cabelo atrás de minha orelha. -Em breve estaremos nós três em nosso devido lar.
-Assim espero. Não só por mim mas, por você, por Cali. Ela merece isso mais do que ninguém. -Suspiro, cruzando os braços. - Isso se ela durar até lá.
-Cali é mais forte do que você pensa, Alexis.
-Gente forte também se machuca, Igor.
Igor não responde.
-Ela é jovem demais pra tudo isso...
-Não confunda juventude com ingênuidade. -Igor dá um tapinha leve em meu ombro. - Agora vai. Depressa. Antes que ele te procure e não te encontre.
Se Garou me procurasse, eu saberia. Posso sentir em minha carne quando ele me quer.
Relutantemente, me despeço de Igor. Olho uma ùltima vez para as pessoas na rua, guardo a imagem como uma obra de arte em minha mente.
Em breve, Alexis. Em breve.
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